The Whale

The Whale ★★★★

Sem espaço para meias verdades, "A Baleia" manipula as nossas emoções com um senso de literalidade corajoso. É o sentimentalismo à serviço de uma crônica pesada sobre um homem preso à sua existência. O diretor Darren Aronofsky captura o tormento do seu protagonista numa obra avessa às sutilezas. É impossível desviar o olhar. É impossível não enxergar. É impossível não entender a natureza deste indivíduo.

E a intenção me parece essa. Criar o choque visual a partir da angústia de alguém consumido. A narrativa áspera e sem um pingo de refinamento contrasta com a perspectiva estranhamente otimista de Charlie. O olhar ávido por um palavra de ternura do monumental Brendan Fraser (que retorno!) revela a sensibilidade escondida na essência desse homem. Um professor preocupado, um pai ausente à procura de uma segunda chance, um marido machucado pelo luto.

Mas esse não é o filme que Aronofsky quer assinar aqui. O diretor não quer sensibilizar com as palavras não ditas, ou com os sorrisos que dizem tudo. Ele quer expor, sem um pingo de romantização (a exceção da cena final), a condição de Charlie. A fotografia de baixa luminosidade transforma um cenário comum num atestado da vergonha que cerca o protagonista. Ele é aquela casa. Ele é quase tão estático quanto aqueles móveis. Ele se julga repulsivo. Quando Charlie caminha (o trabalho de maquiagem é impressionante) nós sentimos o peso nos ombros dele. O físico (claro!) e o emocional também.

Numa comparação curiosa, "A Baleia" seria uma espécie de "anti-Aftersun". Tal qual o reflexivo filme de Charlotte Wells, a tentativa de conexão entre pai e filha centra a trama aqui. A diferença, contudo, está na abordagem. Aronofsky não tolera lacunas dramáticas. O melodrama expressa a angústia de Charlie e a rebeldia de Ellie (vivida por uma elétrica Sadie Sink). O diretor não se permite enxergar qualquer tipo de beleza naquele cenário. Ele assume a voracidade do protagonista como parte da construção de um drama que devora emoções sem pudor. Aquele homem tinha pressa...

Sentir é sofrer para Charlie e o diretor nos desafia a sentir. As emoções surgem atreladas a dor, a falta de ar, a impotência física, ao suor. No seu projeto mais pessimista, Aronofsky se recusa a crer num senso de empatia livre de segundas intenções. E talvez por isso seu filme desafie tanto o seu público a experimentar o tormento físico dele.

Liz, vivida pela radiante Hong Chau, é mais do que uma simples amiga. Ellie só aceita ouvir o pai quando uma oferta tentadora chega ao seu conhecimento. Já Thomas, o missionário atencioso vivido por Ty Simpkins (esse cara era criança até outro dia), parece mais interessado em se salvar do que a ouvir outra pessoa. Aronofsky se recusa a confiar na nossa subjetividade. O que ele quer dizer, é dito. O que ele quer mostrar, é exposto. Sem metáforas. Sem sugestões. Doa a quem doer... "Me escreva algo honesto", diz Charlie para os seus alunos. Aronofsky segue esse princípio com afinco.

Isso é "A Baleia"! Um filme que não se nutre de emoções virtuosas. Aronofsky não quer a nossa pena, nem a nossa empatia. Ele, tal qual Charlie, quer desesperadamente a nossa atenção. Antes que seja tarde...

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ThiagoBarata liked this review