Arthur Tuoto’s review published on Letterboxd:
O filme combina muito bem a tradição - a reconstituição de uma história clássica de monstro, a rejeição de Anno por um visual evidentemente contemporâneo do seu Godzilla - com contextos atuais: a burocracia governamental, o senso de união da nação que ressoa os eventos da tragédia de Fukushima.
O visual do monstro pode não ser contemporâneo, mas toda a ambiguidade que a sua construção representa é. Percebemos tanto o temor que ele representa por sua ameaça à vida humana, como um respeito à sua incrível evolução. Uma compreensão e reverência perante as forças da natureza que o criaram.
Uma ambiguidade que remete diretamente a mitologia de Evangelion. No anime, o inimigo nunca representava apenas uma força destrutiva, mas era, também, fonte de grande conhecimento. Anno evidencia a ameaça - a legítima vocação blockbuster da premissa - mas nunca deixa de lado a sua fascinação pelo desconhecido como um princípio norteador do drama.
Fascinação que, por outro lado, também se dá ao nível dos componentes técnicos e biológicos da história. O diretor insere esses elementos - a minuciosidade do organismo do monstro, a força e o rigor coordenado do exército e dos especialistas - como partes fundamentais da resolução da narrativa.
O longa, no início, pode até ironizar toda essas particulares técnicas na figura dos governantes, já que coloca a burocracia e a própria estrutura do estado como um monstro constitucional. Mas logo transforma isso em uma máquina funcional para o bem. Um elogio que parte dessa mesma constituição do estado como uma peça fundamental na resolução da tragédia.
No ato final, as frentes locais e internacionais se alinham em uma operação que tem sucesso justamente pela organização e potência da suas capacidades. Se em Evanvelion essa combinação entre os mistérios da natureza e a técnica humana catalizava uma tragédia de tons abstratos e possivelmente trágicos, em Shin Godzilla é o perfeito equilíbrio dessa união que salva a nação.